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Hoje
ela se esbalda em produtos de beleza.
“É o
meu pecado. Agora até creme para a boca,
esfoliante
para os lábios eu comprei”, diz Negra
Li |
Gostaram?”, perguntou Caetano Veloso, tímido,
ao grupo de rappers que conversava na saída
do estúdio – era meados de 2002,
e ele acabara de gravar uma participação
especial em um disco de Elza Soares. “Da
hora”, limitou-se a responder Negra Li,
de braços cruzados e cara amarrada, para
uma das maiores estrelas da MPB. As três
palavras trocadas formaram todo o parco diálogo
do primeiro encontro entre os dois. “Foi
a única coisa que saiu. Não sabia
me expressar direito, falava muita gíria”,
diverte-se Negra Li, ao lembrar do episódio.
Quatro anos depois, Caetano (em “Meus Telefonemas”)
é um dos medalhões que participam
de Negra Livre, o recém-lançado
primeiro álbum solo da cantora, que traz
também composições de Nando
Reis (“Negra Livre”) e Marisa Monte
(“Você Vai Estar na Minha”),
entre outros.
Há um ano, Liliane de Carvalho, a filha
de uma funcionária pública e de
um dono de bar deixou de morar com a mãe
na Vila Brasilândia, periferia de São
Paulo, e mudou-se para uma casa alugada de três
quartos em um bairro classe média na
zona oeste da cidade. Recentemente, comprou
também um carro Fox novinho. “Estou
pagando ainda, mas consegui dar uma boa entrada.
Montei minha casinha, consegui comprar meus
móveis – ainda pago prestações,
mas tenho um lugar charmoso e aconchegante para
meu namorado e eu vivermos”, comemora.
O sucesso conferiu uma vida mais confortável
a Negra Li, mas não mudou todos os seus
hábitos. Nome freqüente nas listas
de convidados VIPs das promoters paulistanas,
ela raramente é vista na noite. Também
não passou a comprar na Daslu, templo
do consumo de grandes grifes e altas cifras.
“Não me deslumbro com essas coisas,
não. Fui uma vez (à Daslu)
para ver um desfile, tinha um monte de gente
do rap, que eu encontro por aí.”
A composição de Nando Reis deu
título ao CD. “Quando recebi esse
convite não tive dúvidas. Quis
estar presente no disco dessa voz, dessa cantora,
dessa mulher”, diz ele. Negra Livre
marca o início de uma trajetória
na carreira de Negra Li, 27 anos. Ex-integrante
do grupo RZO e parceira do rapper Helião
no álbum Guerreiro e Guerreira,
de 2004, ela diz que o fato de cantar ao lado
de homens a impedia de mostrar seu lado mais
romântico. “Quando estava com o
RZO e o Helião, não podia ser
tão feminina. Tinha que mesclar meu estilo
com o deles”, explica. “Agora não,
é o que eu cantava em casa, na frente
do espelho: Mariah Carrey, Whitney Houston,
Patricia Marx. Sonhava com isso. Fechava o olho
e me via numa capa (de CD), minha cara ali,
sozinha, escrito Negra Li.” A partir de
novembro, com a estréia de Antônia,
na sexta-feira 17, a cantora que até
agora fez fama com sua voz e rimas passará
a ser reconhecida também como atriz –
sua única experiência na área
tinha sido um curso de um ano de teatro, na
adolescência. Produzida em parceria pela
O2 Filmes e a Rede Globo e protagonizada por
Negra Li e mais três rappers
mulheres (Leilah Moreno, Cindy Menezes e Quelinah),
a série mostrará a vida de quatro
jovens negras da periferia lutando por um lugar
ao sol no mundo machista do hip hop. No início
do ano que vem, o filme homônimo que originou
a série chega às telas.
De família evangélica, Negra
Li diz que aprendeu a ser vaidosa quando passou
a se apresentar em festas e shows. “Minha
mãe nunca me passou isso, sempre a vi
de saia comprida, blusa cobrindo o braço,
nunca teve maquiagem”, lembra. “Com
os shows, passei a arrumar o cabelo do meu jeito,
passar um batom, fazer as sobrancelhas.”
Hoje, ela assume que se esbalda em produtos
de beleza. “É o meu pecado. Agora
até creme para a boca, esfoliante para
os lábios eu comprei. Para o cabelo,
tem que ter uma pomada que deixe no lugar, um
oleozinho para dar um brilho, outro para quando
quiser deixá-lo armado, um gel que não
detone...”, afirma Negra Li, que há
dois anos namora o músico Junior Dread.
O namorado resistiu a ir morar com a cantora
logo que ela alugou a casa onde moram juntos
há nove meses. “Por mim ele teria
ido junto logo no primeiro dia. Mas entendo
o lado dele. Era eu que estava alugando, e ele
é homem, né?”, diz. “Mas
ele foi entendendo que eu precisava dele ali.
Começou com uma cueca, duas, três,
e aí juntamos os trampos”, diverte-se.
“Só não casamos ainda por
falta de tempo.”  |