Quem vê Marco Nanini entregue a personagens
memoráveis no palco nem imagina os fantasmas
que rondam sua cabeça. Uma incontrolável
apreensão toma conta do ator antes da entrada
em cena. Nanini perde toda a energia, busca o silêncio,
fica jogado no chão do camarim. “Fazer
teatro é um saco. Desde que acordo estou preocupado,
não posso comer ou beber tudo o que tenho vontade,
fico apreensivo. Passo em função de
relógios e regras”, diz ele, 57 anos
de idade e 40 de carreira, ao som de gargalhadas e
aplausos em Um Circo de Rins e Fígados,
escrito e dirigido por Gerald Thomas.
A declaração ganha ares de contradição
na boca de um dos mais ativos nomes dos nossos palcos.
“Com essa peça, estou lidando melhor
com essa apreensão. Deve ser porque entro em
cena e fico um tempo parado, observando a platéia
que vou enfrentar. A adrenalina não demora
a chegar. Fecha a cortina e estou pronto para jogar
uma partida de futebol”, conta o ator. Deixando
de lado o gênero, o entusiasmo salta dos olhos
de Nanini. Um Circo de Rins e Fígados
é uma surpresa, não apenas pelo polêmico
dramaturgo ter criado pela primeira vez uma história
linear, mas por ser uma reverência a Nanini.
“Foi a primeira vez que tive coragem de ligar
para alguém e convidá-lo para trabalhar
comigo. Eu me enchi de euforia e terminei o texto
em dez dias”, diz o diretor. Administrar as
agendas e os gênios eram questões que
poderiam inviabilizar o projeto. “Sou um ator
que revira o texto em busca de novas intenções.
As pessoas me diziam: ‘Você está
louco? Não vai dar certo trabalhar com ele’.
Todos se enganaram. Vivemos uma lua-de-mel”,
afirma Nanini, que estenderá a parceria para
o cinema com um roteiro a ser dirigido pelo próprio
Gerald.
Parcerias são a tônica da vida deste
ator. Com Ney Latorraca, dividiu o palco por 11 anos
em O Mistério de Irma Vap, que, transformado
em filme por Carla Camurati, companheira constante,
estréia em maio. A comunhão com Marieta
Severo é, desde 2001, um dos pilares do seriado
A Grande Família, que chegará
à telona em 2006. “Um bom ambiente de
trabalho é tudo o que procuro. Não abro
mão da troca que estabeleci com alguns colegas”,
afirma ele, que viverá Odorico Paraguaçu,
o personagem de Paulo Gracindo na tevê, no longa
O Bem-Amado.
A lista de projetos chega a confundir o ator recifense
que perambulou na infância por Manaus e São
Paulo até se estabelecer no Rio. “Meu
pai trabalhava em hotéis e eu já vivia
em uma espécie de teatro. Os hóspedes
eram como personagens, ficava imaginando as vidas
deles”, conta Nanini. A vocação
se descortinou em uma igreja. Obrigado a acompanhar
sua mãe nas missas, ele se ofereceu, há
40 anos, para fazer uma leitura no púlpito
e se encantou diante do público. Aquele seria
o marco inicial de sua carreira. Nesta virada de ano,
Nanini só quer férias. Alguns dias sozinho
em Alagoas e Fernando de Noronha. E o assédio
dos fãs? “A minha privacidade, ninguém
invade. Esse problema é para galãs.
Já passei dessa fase, ou melhor, nem tive”,
diz ele, soltando uma gargalhada tão saborosa
quanto as que proporciona ao público.
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