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“Ele
me ligava, e eu nunca retornava. A humildade
do Breno sempre me deixou tranqüilo”, diz Zezé
Di Camargo |
O primeiro encontro entre Breno Silveira e a dupla Zezé
Di Camargo & Luciano se deu em 1993 e passou batido
para o cineasta. Em um estúdio do Rio, os cantores
gravaram um clipe da música “Quem Sou Eu
sem Ela”, dirigido por Breno e Andrucha Waddington.
O contato não foi além do profissional,
e ninguém esperava o contrário. “Eram
dois meninos muito simpáticos e talentosos, mas
mal nos falamos. Faz pouco que lembrei o Breno de que
já tínhamos trabalhado juntos”,
conta Zezé.
Para o futuro diretor de Dois Filhos de Francisco,
aquele clipe, um dos tantos produzidos pela Conspiração
Filmes, perdeu-se na memória. Este carioca
de 41 anos jamais havia pensado em ter um CD de Zezé
Di Camargo & Luciano na sua discoteca dominada
por Chico, Caetano, Paralamas e Rolling Stones. E
fazia cara feia quando ouvia falar dos sertanejos
que movimentavam as paradas. Pouco mais de uma década
depois, Breno Silveira bate na boca. Foram justamente
Zezé Di Camargo & Luciano que promoveram
a radical guinada na vida deste sujeito que começou
2005 como o maluco que tinha se submetido a filmar
a história da popular dupla sertaneja e termina
o ano vertido em salvador do cinema nacional. Seu
longa-metragem de estréia, Dois Filhos
de Francisco, levou mais de 5 milhões
de espectadores às salas, um número
que não se registrava havia 25 anos, e pode
trazer para o Brasil o primeiro Oscar de filme estrangeiro.
Não foram poucas as brigas que Breno comprou
para realizar a cinebiografia de Zezé &
Luciano. A maioria delas tinha a ele próprio
como adversário. Quando a idéia chegou
à Conspiração, ele se achou o
menos indicado para o projeto. A falta de identificação
com a dupla e a pouca intimidade com o interior do
País eram motivos para tirar o corpo fora.
“A vida de qualquer um dá um filme”,
disse Breno, antes de ouvir a trajetória dos
cantores, que conheceram o sucesso a partir do desmedido
esforço do pai para transformar os rebentos
em artistas. Bastou tomar conhecimento da sinopse
para Breno ficar com os olhos marejados e, munido
de um sonho tão forte quanto o de Francisco,
pensar que era
hora de superar o persistente medo que o impedia de
estrear na
direção cinematográfica.
E esse não foi um processo simples. Reconhecido
diretor de fotografia, Breno sempre palpitou no filme
dos outros, mas se considerava inapto para assumir
um longa individual. “Uma tremenda insegurança
me acompanhou o tempo todo”, afirma ele, que
nem curtas-metragens havia feito. Pouco depois de
aceitar dirigir Dois Filhos de Francisco,
Breno comprou dezenas de CDs sertanejos e seguiu de
carro para Pirenópolis (GO), o berço
dos artistas, deixando no Rio a mulher, a arquiteta
Renata, e as filhas, Olívia, 11, e Valentina,
9. “Na estrada, eu pensava o tempo inteiro que
estava fazendo a besteira da minha vida, mas decidi
não morrer na praia”, lembra ele.
No set, o cineasta não acompanhava o otimismo
de todos. Paloma Duarte terminou suas cenas e, ao
ver o diretor abatido, disparou: “Vamos fazer
mais de um milhão de espectadores! Aposta um
champanhe?”. Breno olhou para a intérprete
de Zilu e não quis conversa: “Não
enche o saco, Paloma!”. A atriz recebeu a primeira
Veuve Clicquot na segunda semana de setembro e quatro
outras garrafas já chegaram ao seu endereço.
Com o fim das filmagens, veio um conturbado processo
de edição. O cineasta montou uma ilha
em seu apartamento no Jardim Botânico para melhor
controlar o trabalho. “Estava com medo de que
um fracasso arranhasse a Conspiração”,
confessa ele. Tal como o obstinado Francisco, Breno
não poupou a família. “Fiquei
tomado de uma forma que deixei minha mulher e minhas
filhas em segundo plano. Todo mundo sofreu muito pelo
meu sonho”, reconhece ele. “Mal dormia
e já acordava com uma idéia. Tive uma
hérnia, problemas de fígado. A Renata
foi um pouco Helena”, completa o diretor, referindo-se
à compreensiva mãe da dupla, interpretada
por Dira Paes nas telas.
No processo, Breno procurou Zezé várias
vezes e obteve poucas respostas. “Ele me ligava
muito e ficava preocupado porque eu nunca retornava,
me achava desinteressado. A humildade do Breno sempre
me deixou tranqüilo”, diz Zezé.
Com o filme na lata e algumas sessões para
críticos e amigos, a situação
foi mudando. “Comecei a chorar e não
conseguia levantar da cadeira quando a luz do cinema
se acendeu”, lembra Luciano. O primeiro final
de semana abaixo das expectativas caiu como um tijolo
na cabeça do cineasta, que, para contornar
a decepção, locou um van e levou mais
de 20 colegas das filhas para uma sessão. Breno
tomava chope na frente dos cinemas para acompanhar
o movimento, enquanto um motorista rondava as salas
da periferia carioca. Hoje, com os 5 milhões
de espectadores na mão, Breno olha para trás
e se emociona. “Pensei que passaria o resto
da vida como fotógrafo e, aos 41 anos, eu me
orgulho de dizer que descobri uma nova profissão.
Agora, sou um diretor de cinema”, diz ele.
A próxima meta é emocionar Hollywood.
Desde o começo de dezembro, Breno acampou em
Los Angeles, de olho nas projeções para
o membros da Academia. “Ainda é muito
cedo, mas fiquei feliz em ver alguns americanos chorando
no final da sessão. É uma história
de vencedores, bem ao gosto das pessoas que votam
para o Oscar”, afirma ele. O lançamento
do DVD, com a tiragem antecipada de 500 mil cópias,
deve diminuir a freqüência nas salas. Um
novo fôlego só seria garantido com a
indicação ao Oscar, que será
conhecida em 31 de janeiro. “O que vier agora
é lucro, mas eu ficaria bem feliz em ver aquela
gente do Oscar cantando ‘É o Amor’.”
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