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O
recomeço será com a estréia nos palcos
brasileiros na peça Há Vagas para Moças
de Fino Trato (à esqu.), da qual é produtora |
Você
quer ver Deus rir? Conte seus planos para ele. A frase, dita
por um personagem do filme mexicano Amores Brutos, virou
uma das prediletas de Mel Lisboa e traduz bem tudo que vem acontecendo
na vida da atriz. Em 2001, ela se preparava para cursar faculdade
de cinema em Paris mas, pouco antes de viajar, foi surpreendida
ao ser escolhida para viver o papel-título na minissérie
Presença de Anita. Junto com a nova profissão,
que jamais havia sido cogitada por Mel, veio também a fama.
Existe uma linha muito tênue quando você vira
famosa. Você passa a andar na corda bamba. Cair é muito
mais fácil. O difícil é aprender a se equilibrar,
filosofa.
Com
apenas 21 anos, a atriz hoje reconhece que levou alguns tombos.
Mas, com a mesma maturidade com que decifra o furacão pelo
qual passou, mostra-se disposta também a tentar recomeçar,
agora degrau por degrau. Fui posta lá em cima. De repente
olhei e vi que a minha montanha estava totalmente desestruturada.
Pulei etapas, analisa.
O momento
de reflexão aconteceu na ida para Portugal, no final do ano
passado, onde encenou a peça Confissões de Adolescente,
dirigida por Domingos de Oliveira. Durante três meses, longe
da família e do namorado, o ator Caco Ciocler, Mel retomou
a condição de anônima. Morava sozinha num apartamento
de apenas um quarto e na garagem tinha um pequeno carro 1.0 alugado.
Mas o que mais senti falta foi de um porto seguro. Me sentia
desprotegida, conta. A estréia no teatro foi outra
dificuldade. No espetáculo, a atriz tinha de encenar um quadro
de comédia. Fiquei tensa porque tinha que fazer as
pessoas rirem. Não sou comediante, diz. Na volta ao
Brasil, em fevereiro, Mel sentiu os efeitos da crise psicológica
vivida em Lisboa. Assim como ficou sem menstruar na época
de Presença de Anita, desta vez ficou fisicamente
debilitada. Já acordava cansada. Somatizo tudo que
sinto, conta.
A temporada
em Portugal, no entanto, revelou-se enriquecedora. Foi um
momento de introspecção total, lembra a mãe
de Mel, a astróloga Cláudia Lisboa. Minha filha
voltou transformada. Ao retornar, a atriz viu o filme da sua
vida passar na cabeça. Estava indo por um caminho errado.
Às vezes você acha que tem o pé no chão,
mas existe uma coisa que te engole, é muito maior,
diz.
A mudança
começou pelas coisas materiais. Mel trocou um Mercedes Classe
A, adquirido depois da minissérie, por um Palio. O
engraçado foi vê-la explicando ao vendedor na concessionária
que não era uma troca por questões econômicas,
mas por questões filosóficas, conta a mãe
da atriz. Em seguida, veio a compreensão de que tinha que
construir o caminho para voltar ao topo.
Após
um início arrebatador ao viver a sensual e diabólica
Anita, Mel amargou uma personagem que não fez tanto sucesso
na novela Desejos de Mulher, de Euclydes Marinho. Ela admite
que ficou frustrada. Foi um trabalho complicado para mim.
A novela tinha uma certa falta de rumo e não tinha experiência
e técnica para sustentar uma coisa em que não acreditava,
assume. Depois de Anita, um papel muito marcante, ela deveria
ter parado no mínimo um ano. Como isso não aconteceu,
ela se viu fazendo um papel inadequado em Desejos de Mulher.
Faltou paciência e melhor assessoria profissional, diz
Manoel Carlos, autor de Presença de Anita.
Apesar
de não ter ficado satisfeita com sua atuação,
a atriz diz que não se arrepende porque tirou uma lição.
Achava que não tinha me deslumbrado, mas depois percebi
que houve uma certa ilusão comigo mesma. Houve um deslumbramento,
confessa. Sem ter recebido nenhuma proposta da Globo, embora seja
contratada da emissora, ela está aproveitando o tempo para
concretizar seu recomeço com a estréia nos palcos
brasileiros na peça Há Vagas para Moças
de Fino Trato, da qual é produtora e arcou com o orçamento.
Os
cabelos, agora ruivos por causa da peça, talvez simbolizem
essa mudança. Mel quer se desvencilhar da imagem de Anita
e admite que está sendo difícil se livrar desse
carma. Atualmente, conta, às vezes passa até
despercebida nas ruas. E parou de fumar, hábito adquirido
por causa da personagem. Ela também não se identifica
com o estereótipo de ninfeta de Anita. Dá muito
trabalho ter que sustentar isso. E não sou mulherão,
sou baixinha, explica.
As
sessões de análise estão ajudando nessa fase.
Mel já havia feito terapia na adolescência por um ano,
mas depois preferiu os conselhos da mãe. Hoje preciso
de alguém que tenha distanciamento para me dizer certas coisas.
Minha mãe é muito protetora, diz. Dei
a maior força. É bom ficar só no papel de mãe,
concorda Cláudia. As sessões no divã têm
auxiliado Mel a se entender. A atriz lembra que tudo aconteceu muito
cedo em sua vida e que ainda está aprendendo a compreender
alguns momentos. Um deles refere-se ao namorado, Caco. Mel havia
planejado morar junto com alguém somente aos 30 anos. Mas
está adorando a situação. Quando aparece
a pessoa, você vê como é importante acordar e
dormir junto e que um homem faz falta para uma mulher, diz
ela, que saiu de casa aos 20 anos para morar sozinha. 
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