
OSCAR
NIEMEYER |
11/02/2002
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“Brasília
não é o fundamental no
meu trabalho”
O maior arquiteto brasileiro é homenageado em Paris mas não vai
por medo de avião, critica a evolução de Brasília e conta que gasta
tudo que ganha
Luís
Edmundo Araújo
Leandro Pimentel
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Niemeyer
não está satisfeito com Brasília: “Com o tempo, perde a unidade.
Isso se vê nas ruas, na mediocridade da sua arquitetura, na
profusão de anúncios que a compromete. O pior é ver o Eixo Monumental
inacabado” |
O
mais importante não é a arquitetura, mas a vida, os
amigos e este mundo injusto que devemos modificar. A frase
traduz o pensamento de Oscar Niemeyer, mas não foi dita.
Está escrita entre os esboços do Congresso Nacional
e de outros projetos do arquiteto, desenhados nas paredes brancas
de seu amplo escritório, numa cobertura da Avenida Atlântica,
no Rio. É nesse espaço claro e rodeado pelo mar de
Copacabana que o autor dos prédios símbolo de Brasília
passa a maior parte de seus dias. Aos 94 anos, continua em plena
atividade. Tem projetos em Niterói (RJ), Curitiba e nutre
a expectativa de concluir o Eixo Monumental do Distrito Federal
que o arquiteto ainda chama de nova capital apesar de seus
quase 42 anos de existência , como prometeu o governador
Joaquim Roriz.
Os trabalhos poderiam servir de desculpa para a decisão de
não prestigiar a exposição com a retrospectiva
de sua obra, inaugurada no dia 5 de fevereiro, em Paris, mas Niemeyer
é sincero: Prefiro ficar no Rio, olhando o mar.
No escritório que se debruça sobre Cobacabana, a decoração
é completada por outro pôster com fotos de projetos
do arquiteto, como a Universidade Constantine. Uma sala menor serve
de refúgio. Nela, uma foto artística de duas mulheres
nuas divide espaço com os livros sobre a obra de Niemeyer,
que ele não lê. No canto da pequena sala, um cavaquinho
e um violão parecem esquecidos. Já toquei, mas
parei há muito tempo, conta o arquiteto, que está
casado há 73 anos com Annita Balbo, é pai de Anna
Maria e avô de cinco netos.
É
verdade que o senhor tem medo de avião?
Não gosto. Viajei muito na vida, andei muitas vezes de Concorde,
mas sempre achei horrível. Tinha que tomar um porrezinho,
uma boa dose de uísque, para me tranqüilizar. Só
me sentia bem quando punha o pé na terra. Agora quero ficar
em casa. Me perguntam se eu posso ir a algum lugar de avião
e eu digo que vou. Depois na hora eu digo que não tenho vontade
de ir, que prefiro ficar.
Por
isso não foi à exposição de Paris?
A exposição será inaugurada dia 5 de fevereiro
(a entrevista a Gente foi concedida no dia 25 de janeiro).
No dia 8 eu teria de estar na Universidade de Sorbonne para receber
uma homenagem lá. Dizem que isso era importante para minha
carreira de arquiteto, que é a primeira vez que chamam um
arquiteto lá na Sorbonne, mas preferi ficar no Rio.
Qual
o segredo para continuar em plena atividade aos 94 anos?
Tenho uma maneira de trabalhar diferente. Trabalho sozinho. Arquitetura
é muito pessoal. Aqui sou o único arquiteto. Quando
acabo um trabalho, passo para o escritório do centro da cidade,
onde meus colegas Ana Elisa Niemeyer, minha neta, Jair Valera e
João Niemeyer, meu sobrinho, desenvolvem os projetos. Assim,
tenho o dia mais livre, posso atender às pessoas. Trabalho
da mesma forma que sempre trabalhei. Sei o que gosto e faço
minha arquitetura baseado nisso. Você pode ver aí na
minha estante uns 40 livros sobre o meu trabalho. Eu não
leio.
Por
quê?
Não é que eu despreze o que eles fazem, pelo contrário.
É que procuro defender minha intuição. Cada
arquiteto deve ter sua arquitetura. Não critico ninguém.
Se o arquiteto faz a arquitetura que ele gosta, é o bastante.
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