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Novas e velhas fábulas dão face ao povo de um lugar


Sexta, 07 de dezembro de 2001, 11h34

No século 18, dois irmãos ganharam emprego e prestígio porque descobriram um público, o infantil. Antes de completar 30 anos, os advogados alemães Jacob e Wilhelm Grimm publicaram sua primeira versão de histórias infantis da tradição oral. O livro foi tão bem-sucedido que lhes ditou o rumo de uma vida septuagenária como folcloristas. Branca de Neve estava entre essas histórias.

A sina da princesa, como os Grimm a narraram, difere daquela que se consagrou. Uma rainha dá à luz Branca de Neve. Todos os dias, o espelho diz à soberana que ela é a mulher mais bela. Mas, no dia em que Branca completa 7 anos, ela lhe toma o lugar na preferência do espelho. A rainha odeia a filha. Manda caçá-la, mas ela foge. A soberana decide fazer o serviço por conta própria. Da primeira vez, disfarçada, aperta sua cintura com um laço; da segunda, lhe dá um pente envenenado; da terceira, a faz comer a maçã. Branca de Neve dorme por anos, sem que os anões da floresta a enterrem. Chega o príncipe e se apaixona pela moça que nunca apodrece. Ele convence os anões a levá-la ao castelo. Um dia, o corpo da mulher escorrega pelo chão e o pedaço de maçã envenenado sai pela boca. Branca ressuscita e o príncipe quer casar. Ambos convidam a rainha ao casamento. Lá, ela é obrigada a dançar com sapatos de ferro quente até a morte.

Quanto sabor para um tablóide! Na Alemanha do século 18, a história ecoou no público infantil, assustado à hora de dormir. Em 1934, Walt Disney, que então contava 33 anos, vindo de uma bem sucedida carreira de curtas-metragens, decidiu que Branca de Neve seria a narrativa ideal para o primeiro longa de animação da história do cinema. Como os Grimm, ele era um bom pesquisador. Mas, em adição aos irmãos, exercia a ciência dos lucros.

Branca de Neve saiu em 1937 e, hoje, recebe sua primeira versão em DVD. A história foi modificada por Disney, cujo centenário de nascimento comemorou-se no dia 5, e a quem um de seus biógrafos denominou Príncipe Sombrio. Ele deu luz e trevas a Branca de Neve. Seu enredo estabelecia que a rainha má não era mãe, mas madrasta. E que Branca de Neve, adolescente, não se vingava de ninguém ao final.

O filme iniciou a fortuna de Disney - US$ 300 mil de lucro na temporada - e lhe permitiu a construção de um império sob dois pontos de vista: o financeiro, com altos e baixos no decorrer das décadas, e o imaginário, que sempre recompôs a empresa a cada erro de administração. O império erguido a partir de Branca de Neve é o de mentalidades, e este o furacão financeiro jamais destruiu.

Não se tratava de um filme ingênuo, portanto, este Branca de Neve, nem poderia sê-lo, até porque o mundo à época assistia perplexo à depressão advinda de 1929. No mesmo período, na Alemanha dos antepassados Grimm, a pobreza engendrava uma ditadura. Então, neste filme, Disney fazia um pouco como os colecionadores de história que o precederam: propunha uma redenção financeira e moral a seus personagens, mas não escondia de ninguém que, para se salvar, era preciso que o ser humano antes enfrentasse com criatividade a floresta escura da pobreza e das más intenções.

O produtor colocou o estúdio em favor da idéia. Treinou animadores com cursos e lhes deu estímulos. Um desses profissionais, Ward Kimball, que fala no documentário do DVD, conta que cada desenhista do estúdio ganhava de 5 a 50 dólares por uma boa piada. Conhecido pela autoridade e pelo egocentrismo, Disney se vingava sendo um perfeito manipulador de suas próprias fantasias.

A Branca de Neve de Disney desenhava um ideal improvável. Era inconsciente da própria beleza. Intuitiva, mas cega para a maldade alheia. Pudica. De uma estupidez sincera. Nada nela evocaria um espelho em Disney. Mas não representariam esses os ideais inatingíveis, a bondade e o encanto da personagem? A rainha que se opunha à heroína era, ao contrário do que sugeriram alguns desenhistas do estúdio, linda, uma Joan Crawford que não usava com generosidade sua inteligência. Ninguém deseja viver ao lado de uma mulher esperta que o desgrace e empobreça. Disney, menos.

O filme exercia a edição com sabedoria. Príncipe Sombrio cuidou pessoalmente para que a narrativa tivesse a duração ideal. Em favor do ritmo, jogou fora seqüências criativas. A ação é ininterrupta. O horror, obtém-se em poucos minutos: com Branca de Neve na floresta, no esquife da princesa, no raio que joga a Bruxa do penhasco. Porém, contra todas as desgraças, Disney opôs célebres (depois amaldiçoados) passarinhos num cenário de livro, ilustrado por europeus. Deu uma cara gordinha, rosada e sem pescoço a Branca de Neve, um bebê em meio a sete outros bebês com qualidades da primeira infância: o dengue, as alergias, a braveza, o sono, o riso, a graça muda e a arrogância.

Disney prosseguiu construindo seu universo em que muitos vêem, com justiça, a perversão (Dumbo, aos 60 anos, também entrou à venda em DVD), mas algo em seu trabalho sugere sinceridade. Ele queria construir uma mitologia. Queria ver ressaltados valores, ainda que os do capitalismo e os da família-burguesa-como-a-conhecemos. Em nossos dias, tais intenções naturalmente não contam, e é neste ponto de cinismo por cinismo, dentro da vala comum das aspirações, que nos encontramos na animação infantil.

Shrek, da SKG Dreamworks, de Steven Spielberg, é um bom exemplo. A animação digital em torno de um ogro contra os contos de fadas se pagou num único fim de semana e arrecadou, neste ano de seu lançamento, US$ 150 milhões. Em que pese todas as inovações, as texturas de Shrek não sugerem novidade. Assistir a ele é como superar os obstáculos de um game. Em alguns momentos, como na arte marcial da princesa Fiona, essa situação é explicitamente invocada. À parte isso, a história bane a naturalidade. O ogro Shrek só tem um pensamento: viver longe de todos, num pedaço de terra que a nobreza lhe dará em troca de um favor. Um impressionante toma-lá-dá-cá.

Ainda assim, para o público que o aplaudiu, ele é o herói. Está certo que se apaixona, mas por uma moça igual a ele. Ele não quer progredir - não num sentido, digamos, espiritual. Shrek é o que todas as iradas vítimas de Disney esperavam, uma contraposição bombástica e negativa a um mundo de fadas colorizado. Na aldeia de Shrek, o sabor é o fedor. A ausência absoluta de solidariedade, a indiferença e o oportunismo são os valores. Valores cínicos e destrutivos, mas divertidos. O público imenso nem reclama da ausência de uma história consistente - Shrek libertou o público da consistência. Reunião de piadas, o filme, feito antes de 11 de setembro, capenga até o fim.

Quem discutirá se o público está certo? Novamente, o filme é um espelho, espelho meu. Shrek decepciona especialmente porque, há seis anos, a animação parecia dar um passo adiante com o advento de Toy Story, de John Lasseter. Hoje vice-presidente de sua companhia, a Pixar, da Califórnia, Lasseter fez algo pioneiro, como Disney, no passado: o seu foi o primeiro longa-metragem inteiramente computadorizado da história. Mas, por uma miraculosa junção de talentos, não se resumiu a isso. Era, como Branca de Neve, um filme bom.

Em Toy Story, o primeiro desenho animado indicado ao Oscar de melhor roteiro, brinquedos movem o mundo na ausência de seu dono, um menino. As criaturas amam o garoto, mas também sabem que ele irá abandoná-los um dia. Sua luta está em viver ao lado do menino, com o amor que ele pode lhes dar, pelo tempo que for, ou viver mais, longe dele, sem o carinho infantil. Em Toy Story 2, de 1999, a questão é resolvida: melhor viver com o dono do que mofar eternamente. O personagem Woody resume este ideário ao dizer: 'É preciso aprender o sentido de brincar.'

Quando a Pixar viu sua idéia triunfar em Toy Story 1 - em nove anos, o filme fez US$ 350 milhões -, partiu sem hesitação para esse mundo de valores e palavras. Vida de Inseto, de 1998, seguia na trilha da 'união faz a força por um mundo melhor'. Era, novamente, um bom filme, seguindo uma boa receita.

'Nenhuma tecnologia transforma uma má história em uma boa história', disse Lasseter a Steve Jobs, o todo-poderoso da Apple que, em 1986, comprou por US$ 10 milhões a empresa que ex-funcionários da divisão de efeitos especiais da Lucasfilm, de George Lucas, haviam formado. Foi algo que Jobs jamais esqueceu. Na Pixar, que começou com três dezenas de funcionários e hoje abriga seis centenas, há uma universidade com cursos de três meses para profissionais e uma atualização constante de tecnologias. Todos ali, seguindo a lição de Lesseter, dão valor ao ato de escrever.

Foi assim também com Monstros S.A., que entra em cartaz hoje no Brasil e que, no fim de semana de estréia nos EUA, em novembro, arrecadou US$ 63,5 milhões, a maior bilheteria da Disney (desde 1997, a Pixar mantém com a companhia um contrato para a realização de cinco longas; espera-se que, no futuro, ela compre 5% da empresa de animação).

Monstros, primeiro longa dirigido por outro profissional da Pixar além de Lasseter, o estreante Pete Docter, avança alguns passos em relação à animação, especialmente àquela complicadíssima, de pêlos e cabelos, e capricha na tridimensionalidade e nas cores. Mas a história é ruim, mal ambientada numa empresa que vive de assustar as crianças (difíceis de assustar), e armazenar seus gritos. O filme prega a destituição dos burocratas que arruinam as empresas. Para uma fábrica funcionar bem, é preciso que todos, nela, sejam felizes.

Mas este será um assunto para o público infantil? A quem interessa que as empresas funcionem, eternamente e felizes? Seguramente, interessará à Pixar. É um filme que fala para os seus. As piadas não funcionam. E o velho truque do monstro apaixonado pela menininha é, bem, um velho truque.

O filme tem seu interesse, ou não faria público. Um raciocínio que bem pode se aplicar à mitologia nipônica de Dragon Ball Z, o Filme. Feito em 2000 a partir da série de televisão, vendido agora em bancas na versão videocassete, Dragon Ball difere do padrão Disney. A animação é fraca e imperfeita, e os personagens têm pouco ânimo, a não ser o de gritar, pular e rir alto. Mas há um ponto a seu favor: eles se modificam. Crescem. Maus, podem se tornar um dia bons. Bons, vítimas de uma armadilha, podem virar monstros, como Hulk.

No filme, um pai de família, o lutador Goku, tenta introduzir, contra a vontade de sua mulher, o filho Gohan no mundo das sagas alienígenas. Os alienígenas são, comumente, maus, querem plantar a semente da destruição na Terra, mas há um purgatório eterno em que sua alma pode ser purificada. A certa altura, Gohan, por ação de um desses seres, ditos saiya-jin, torna-se um gorila gigantesco. É comovente ver o pai Goku, contra toda a insensatez, buscar devolver ao filho sua vida anterior.

À parte esse poderoso e multinacional mundo das histórias de fadas, o Brasil surge com um renascimento, o dos contos infantis da série Disquinho, criados por João de Barro e orquestrados por Radamés Gnatalli nos anos 60. A crítica hoje se entusiasma em denegri-los, como a denegrir uma época, e clama para que os contos sejam refeitos. Novamente, é um mundo de espelhos. Nos anos 60, Chapeuzinho Vermelho, aliviada com a morte do Lobo, cantava: 'Posso caçar borboletas!' Sua felicidade envolvia muitas mortes, e as crianças a adoravam.

Continuam a adorar hoje? Sim, do mesmo modo que apreciam A Formiguinha e a Neve, a luta do inseto contra a morte, num mantra de horror (algo como se o pesadelo de Branca de Neve, na floresta, durasse 11 minutos). João de Barro, o Braguinha, aparece aqui como o Príncipe Sombrio. Mas terá errado? Em A Cigarra e a Formiga, ao contrário do que prega a lenda, pacificou a convivência das duas inimigas, a artista e a trabalhadeira. As crianças admiram as forças que dão entranhas à vida, e é por isso que querem 'Dragon Ball Z' e pedem por mais e melhores ogros e monstros. Não será preciso pacificá-las contra todas as verdades, especialmente as do passado. Quanto mais diversa e facetada, mais rica é esta vida, com a qual, diz 'Toy Story', devemos aprender a brincar.

Rosane Pavam
Investnews/Gazeta Mercantil

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