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COMO ENLOUQUECER SEU CHEFE

RAPIDINHO

Cinema americano não é, necessariamente, sinônimo de super-produção, orçamento mega-astronômico e elenco multi-milionário. Como Enlouquecer seu Chefe é um pequeno e divertido filme, que às vezes até parece uma "sit-com" televisiva, baseado num roteiro inteligente de Mike Judge, que lembra muito as tiras de "Dilbert". Não sei se Judge admite a influência, mas o ambiente da empresa em que trabalha Ron Livingston (o protagonista do filme), a fauna variada de seus colegas, a ditadura dos memorandos, a boçalidade premeditada do chefe, além de muitas situações kafkianas, tudo leva à criação genial de Scott Adams.

Judge, que inventou "Beavis & Butt-Head", demonstra agilidade narrativa e uma boa consciência das diferenças entre o humor politicamente incorreto de seus filhos mais famosos (adequado para histórias curtas, em canais alternativos, como a MTV) e as pitadas homeopáticas de anarquismo (na dose certa para não assustar a grande mídia) que dão um sabor interessante a "Como enlouquecer seu chefe". Judge é um sopro de esperança e renovação estilística num cenário em que a regra costuma ser "faça igual aos outros, ou pelo menos disfarce bem suas diferenças".


AGORA COM MAIS CALMA

Os americanos costumam ser muito orgulhosos de seu sucesso econômico e da sociedade teoricamente "livre" que este sucesso gera. A idéia de que qualquer um, com seu esforço pessoal, pode ascender financeiramente e conquistar seu sonho, ainda é veiculada massivamente pelos meios de comunicação. A diferença entre republicanos e democratas é que os primeiros chamam os eventuais sonhadores fracassados de "vagabundos" ou "inúteis", desejando que morram logo, para não prejudicar o país; enquanto os segundos preferem chamá-los de "socialmente desajustados", desejando que vivam o suficiente para ajudar o partido na próxima eleição.

"Como enlouquecer seu chefe" brinca sem parar com essa idéia de que o trabalho duro é a alavanca para o sucesso. Um programador de computadores, que passa seus dias revisando milhões de linhas de código e sendo humilhado pelo seu chefe, um dia decide tentar uma coisa diferente e recorre a um hipnotizador, que sofre um enfarte fulminante depois de injetar no cérebro de seu frustrado cliente uma mensagem subliminar muito perigosa: a vida é para ser vivida - o resto é bobagem, inclusive o trabalho.

Esse truque de roteiro, nem um pouco verossímil, dá o tom do resto do filme, que vai abandonando o realismo inicial e aproximando-se pouco a pouco de um humorismo mais "non-sense", que lembra um pouco o clima do Monty Phyton. O elenco é homogêneo e bem dirigido, algumas piadas são muito engraçadas e o ritmo não cai (até porque o filme é curto).

Destaque para Gary Cole, que compõe um chefe de escritório perfeito, odiado por todos. Destaque também para o(a) figurinista do filme, que vestiu Cole com aquelas camisas sociais de listras azuis com a gola branca, o uniforme universal do executivo imbecil. (Se você, meu caro leitor, estiver, neste momento, com uma camisa dessas, me perdoe, mas vá correndo trocar de roupa: tem certas coisas que não é possível admitir, mesmo que seja presente de sua mulher).

Jennifer Aniston faz aquele seu velho papel de garota simpática, meio boba, mas de bom coração. É uma sub-Meg Ryan, ou uma boa estepe para Sandra Bullock. Enfim, não prejudica, mas também não acrescenta grande coisa. Ron Livingston dá conta do recado, de forma discreta e eficiente. Mas ele não é particularmente engraçado. Mike Judge perdeu uma boa oportunidade de ir mais fundo na crítica ao "sonho americano". De certa forma, quando faz os dois consultores de empresa identificarem, no comportamento alucinado do personagem de Livingston, um talento subestimado, está ratificando a idéia - tão cara para os americanos - de que as soluções partem dos indivíduos, de suas superações ou de suas qualidades invisíveis.

O final também é meio bobo e bastante previsível. "Como enlouquecer seu chefe" é um filme que será facilmente esquecido. Seu humor não é suficientemente anárquico para balançar as estruturas que critica, nem realista o bastante para incomodar de verdade os milhões de idiotas que criaram e mantêm essas estruturas (com exceção, é claro, dos que usam camisas sociais de listras azuis com a gola branca). Mas o saldo final é positivo. Quando o cinema brasileiro aprender a fazer filmes baratos, pequenos e competentes como este, tudo será mais fácil.


Como Enlouquecer seu Chefe (EUA, 1999). De Mike Judge.

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Carlos Gerbase é jornalista e trabalha na área audiovisual, como roteirista e diretor. Já escreveu duas novelas para o ZAZ (A gente ainda nem começou e "Fausto") e atualmente prepara o seu terceiro longa-metragem para cinema, chamado "Tolerância".

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