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QUANDO PARIS ALUCINA ("Paris when it sizzles"), 1963, de Richard Quine, Paramount Pictures

RAPIDINHO

Roteirista americano está em Paris há alguns meses para, supostamente, escrever o roteiro do filme "A garota que roubou a torre Eiffel" (cujo argumento é de sua autoria). Já recebeu um adiantamento, e o produtor aguarda, ansioso, o trabalho concluído. Só há um problema: o prazo de entrega se aproxima, e o roteirista ainda não escreveu uma linha sequer além do título, pois estava muito ocupado bebendo, namorando e passeando. Como ele resolve a situação? É muito simples – contrata uma linda datilógrafa. A relação entre o roteirista (William Holden) e a datilógrafa (Audrey Hepburn) é o mote para um roteiro divertido, que contém algumas cenas antológicas. Aliás, só estou escrevendo sobre o filme pela lembrança de uma dessas cenas.

AGORA COM MAIS CALMA

Poderia ser "A noite americana", de Truffaut. Poderia ser "O desprezo", de Godard, ou "O jogador", de Altman. Ou "O último magnata", de Elia Kazan, ou "Cantando na chuva", de Stanley Donen e Gene Kelly. Todos esses filmes são melhores e mais importantes que "Quando Paris alucina", que tem lá seus momentos de chatice. Mas eu queria escolher um filme quer falasse sobre cinema com a mesma despreocupação com que eu escrevo sobre ele. Dizer que "Quando Paris alucina" é um clássico certamente é um exagero, pois é um filme de um diretor pouco conhecido, com problemas de ritmo e que não consta das milhares de listas de obras-primas do cinema.

É um filme comum, de estúdio, uma comédia feita para entreter as massas e ganhar dinheiro. O que não o impede de ser um retrato ao mesmo tempo engraçado e honesto dos mecanismos de Hollywwod. E não tenho medo de apontar uma de suas cenas como "clássica" para as pessoas que se dispõem a não só a consumir cinema, mas a entendê-lo.

Quando a datilógrafa pergunta em que pé está o trabalho (que deve ser entregue, impreterivelmente, dali a dois dias), o roteirista diz que só falta colocar no papel, pois já está pronto na sua cabeça. E começa a enfileirar páginas em branco, descrevendo uma ação imaginária que segue, passo a passo, os ensinamentos do "Manual do roteiro", de Syd Field, atual bíblia dos escritores de Hollywwod: descrição dos personagens e do cenário, seguida de conflito, seguida da "primeira virada", e daí por diante. É tudo muito divertido, e Audrey Hepburn (maravilhosa e extremamente sexy, apesar de só mostrar o pescoço e os tornozelos) logo está à mercê daquele sujeito fantástico, bêbado e fanfarrão, que tem a capacidade de transformam uma história, por mais besta que ela seja, num momento de emoção e catarse.

Quase tudo funciona: o elenco, a direção, a música, as participações especiais de Tony Curtis e Marlene Dietrich. As brincadeiras metalingüísticas é que são meio infantis e repetitivas. "Quando Paris alucina" é um filme inocente e despretensioso, realizado com uma leveza que Hollywood foi perdendo aos poucos, até se transformar nessa máquina pesada demais, comprometida demais, preocupada demais, em que o humor oscila entre o escatológico e o besteirol, com as exceções de sempre. É como se uma fábrica de salsichas, de repente, perdesse a receita da salsicha, e tivesse de enganar os fregueses com doses cavalares de mostarda e ketchup. Quine tinha a receita e sabia levá-la ao forno. É pena que o prato não tenha ficado perfeito, mas aquela cena do roteiro sendo estruturado, sozinha, amigos do ZAZ, vale o aluguel da fita na locadora.

"Quando Paris alucina", de Richard Quine, com William Holden e Audrey Hepburn. Participações especiais de Marlene Dietrich e Tony Curtis. Roteiro de Gregoire Aslan. Música de Nelson Riddle.

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Carlos Gerbase é jornalista e trabalha na área audiovisual, como roteirista e diretor. Já escreveu duas novelas para o ZAZ (A gente ainda nem começou e Fausto) e atualmente prepara o seu terceiro longa-metragem para cinema, chamado "Tolerância".

 

 

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